22 de fevereiro de 2011

Pedro, o que é depressão? - Capítulo II

A amizade de Pedro e Sofia fluiu naturalmente nos meses seguintes, pareciam duas metades de uma mesma alma. Os mesmos gostos, mesmos trejeitos, a mesma solidão. Sofia finalmente descobrira o significado prático da palavra amigo. Com o tempo, os 17 minutos antes da aula e os vinte minutos de intervalo tornaram-se insuficientes para suprir a necessidade que tinham um do outro.
- Você quer ir lá em casa depois da aula? - perguntou ele - Pra gente bater um papo, ver um filme, sei lá.
Sofia não dispunha daquele tipo de liberdade, era filha de pais superprotetores. O que diriam da filhinha frequentando a casa de um sujeito qualquer após as aulas?
- Eu não sei Pedro. Não sei se deveria. - respondeu encabulada.
Ela acabara de completar 12 anos e embora tivesse maturidade superior a sua idade os pais a viam como uma garotinha ingênua e indefesa. - Eu vou ver se posso.
- Tudo bem, nos vemos amanhã então - disse ele enquanto a abraçava - até mais miniatura.
Sofia adorava o sorriso de Pedro, a forma como os músculos se contraiam e pareciam apertar seus grandes olhos castanhos.
Aos 16 anos, Pedro cursava o primeiro ano do ensino médio e mostrava-se um aluno extremamente aplicado. Ele possuia uma habilidade que Sofia julgava formidável. Tinha um ar misterioso que atraia olhares por onde passasse, com seu All Starnos pés, um livro embaixo do braço e um casaco, parecia enfeitiçar todos ao redor. Mas era difícil de ser conquistado, as conversas em geral eram sobre assuntos cotidianos: filmes, livros, música etc. As cicatrizes que ele escondia eram bem mais profundas que aquelas que o casaco cobria. Pedro tinha medo que Sofia tivesse que lidar com os mesmos problemas pelos quais ele passou devido ao seu isolamento. Via nela uma maneira de fazer tudo diferente. Talvez pudesse fazer tudo dar certo desta vez.
Talvez.

19 de fevereiro de 2011

Pedro, o que é depressão? - Capítulo I

 Sofia era uma menina introvertida. Durante um longo tempo de sua vida sua única companha foram os livros, pelos quais era apaixonada. Sua vida acadêmica havia sido sempre um sucesso, pudera, ela se abstinha de todo e qualquer contato social, não havia nada que a distraísse. Durante toda sua vida escolar Sofia não conseguiu socializar-se com ninguém por mais de 32 minutos, o tempo necessário para realizar os trabalhos passados em sala de aula. Foi assim até chegar até a 6ª série. Ela sempre chegava exatamente 17 minutos antes das aulas começarem, sentava-se no banco embaixo da rampa de acesso ao segundo andar, abria o livro da vez e ali permanecia até escutar o segundo sinal. Naquele primeiro dia de aula ela repetia seu ritual, atravessou o portão de grades e seguia em direção ao seu lugar cativo concentrando-se apenas nas pontas de seus sapatos. Ao erguer a cabeça surpreendeu-se, o lugar estava ocupado. Deteve-se por um momento a lado daquele estranho, revirando suas memórias tentando encontrá-lo. Há muito não esbarrava com ninguém naquela parte da escola, aquele canto era só dela. Estava tão entretida em seus pensametos que não percebeu quando ele  levantou a cabeça e ergueu a mão em sua direção.
- Bom dia, estou roubando seu lugar? - disse ele com um sorriso largo no rosto.
Ela permanecia atônita, a única coisa com a qual não tinha perícia era no trato com outras pessoas. O pensamento fervilhava de possíveis respostas enquanto Sofia se mantinha estática.
- Tudo bem, eu já estava indo embora.
- Não - adiantou-se ela - erh, desculpe, eu não estou muito acostumada com pessoas. - disse tentando não espantá-lo.
Geralmente não se sentia à vontade em meio a elas, mas com ele era diferente. Ele tinha os mesmos trejeitos, até a posição em que estava sentado, pernas cruzadas, tronco encurvado e o livro posicionado na mão direita. De alguma forma, Sofia se via naquele jovem de longos cabelos negros e pele tão pálida quanto aquela que imaginava ser a do vampiro Antoiné.
Ele reergueu a mão em sua direção enquanto se apresentava.
- Muito prazer, meu nome é Pedro. É meu primeiro ano aqui, será que poderia me apresentar a escola?
- Seria um prazer te acompanhar, à propósito, eu me chamo Sofia. - respondeu ainda desconfiada enquanto apertava sua mão estendida -Eu posso perguntar qual livro está lendo?
- Ah, claro. - falou enquanto passava para suas mão uma cópia de "Admirável Mundo Novo" - Conhece?
Soava o primeiro sinal quando ela respondeu que aquele era um de seus livros favoritos. Sofia sorria um sorriso amarelo enquanto pensava no que diria a seguir, os incontáveis treinos frente ao espelho de nada adiantavam agora.
- O que você acha de debatermos ele qualquer dia então? Ao que parece teremos boas conversas por aqui antes do segundo sinal. - disse Pedro, com um sorriso que suprimia todo e qualquer anseio de Sofia.